Findo o Entrudo, acabaram as tréguas do pecado. Amanhã
é Quarta-Feira de Cinzas. As cinzas é o que sobra das “queimas” no entrudo. Queimou-se,
pois, o que resta dos dias de pecado. Na ótica cristã, inicia-se agora a
caminhada para um tempo novo, o tempo primaveril, sempre mais esperançoso que o
inverno que fica para trás. Mas para o alcançar, há que suportar um tempo de
purgação, penitência, de rigores incontornáveis: a Quaresma.
Por isso, amanhã saem a Morte e os Diabos à procura
dos incautos. Os Diabos, sempre mais frenéticos, pois andam sequiosos de almas
pecadoras. Ou seja, a Morte leva-os e o Diabo seleciona-os!
Assim se cumpre a tradição transmontana, única em
Portugal. Em Vinhais, saem à rua a Morte e os Diabos (a lógica da tradição
manda que seja na 4ª feira, mas, pelo que vejo no cartaz, outras “lógicas”
empurram-nos para sábado…).
Por sua vez, em Bragança estas duas tenebrosas
criaturas saem acompanhadas de uma outra: a Censura. A Morte, na imagem de um
esqueleto com a sua gadanha. O Diabo com os cornículos e o tridente. A Censura
com enormes tesouras à cintura. Interessante a simbologia desta última: reflete
o equilíbrio, a repreensão pelos atos levianos; ou seja, um derradeiro esforço
para que, perante a inevitabilidade da morte, o diabo não venha de garras
afiadas arrastar mais uma alma para o seu reino infernal.
Nada acontece ao acaso nestas tradições. Nada é
importado. Tudo tem coerência na lógica ancestral do povo cristão transmontano.
AP